Vazio

Passando pelas ruas, desviando por entre as pessoas nas calçadas lotadas. Não tinha um destino específico, era apenas algo dela. Algo íntimo dela. Passear pelas ruas cheias de pessoas inexpressivas era até irônico dizer que, reconfortava seu coração.
Levantava cedo e ia direto para o banheiro tomar seu banho matinal, escovar os dentes e passar seu costumeiro batom vermelho. Apagava todas as luzes, abria a porta, saia e trancava-a novamente. Dava uma olhada nos dois cachorros que ao perceberem a presença da dona, levantavam as orelhas e preguiçosamente iam ao seu encontro para cumprimentá-la com lambidas nos dedos pálidos.
Isso já se tornara rotina.
Depois que ganhava as ruas, olhava para as direções que estavam ao seu dispôr e escolhia a qual nunca havia passado. Assim ela fazia a sua caminhada matinal. Não era por estética. Não era por beleza que ela gostava de andar. Mas sim por uma forma de encontrar a paz interior. E ela se achava nas ruas da cidade. Observando a movimentação. Observando o quanto a natureza era linda e o quanto o homem, por mais perverso que fosse, conseguia fazer verdadeiras obras de arte, tornando-a uma selva de pedra.
Gostava do cheiro que vinha das árvores.
Única coisa que não entendia, e, por consequência, encarava a situação com sarcasmo, era o modo em que as pessoas se interagiam entre si. Uma com sorrisos fáceis, mas superficiais. Outras com escandalosas gargalhadas, superficiais também. Tudo era superficial. Eram pessoas vazias. Não tinha qualquer tipo de sentimento ali. As pessoas riam por uns segundos e logo voltavam para a costumeira expressão-sem-expressão. As pessoas conversavam, mas era assuntos vazios, e assim que se despediam, voltavam para a expressão neutra.
E ela apenas observava esses modos, sem entender. Mas no seu íntimo, tudo o que ela queria era ter um amigo, um namorado ou qualquer outra coisa. A monotonia havia se alojado de forma permanente em seu ser. E era algo que ela não podia lidar.
E ao final de tudo, ao chegar em casa, se olhar no espelho, percebeu sua imagem refletida e concluiu: tinha a mesma expressão vazia, até mais vazia, que aquelas pessoas que ela reparou em mais uma de suas caminhadas matinais.


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